Todos os dias acordava cedo, com a casa já vazia, demorava alguns minutos pra levantar, às vezes entre cochilos, outras entre rápidas olhadas nas redes sociais. Levantava, fazia seu próprio café sem se esquecer de dividir um pouco do pó com a pia, feita de mármore branco, e apreciava os breves 20 minutos do dia em que tinha liberdade. Liberdade para pensar, para observar o vapor do café quente embaçar seu óculos e vez ou outra liberdade para escolher ficar em casa um pouco mais.
Corria para arrumar o que faltava, para pegar o transporte, para conseguir a mesa do meio, a única em que da janela se via os carros lá fora ao mesmo tempo em que a entrada da biblioteca, e entre raspas de borracha e manchas de tinta azul nas mãos, sentia que o dia ficava mais completo quando ouvia uma buzina distante ou a chegada de novos passos no local. Parava quando se confundia entre as palavras e só então notava que já estava ali há horas, na terceira ou quarta matéria do dia, com as costas doloridas, os ombros encolhidos, o canto do dedo, aquele com o pequeno calo que apoiava a caneta, vermelho como as bochechas, que desde pequena teimavam em ficar rosadas. Assoprava, ato que sempre pareceu trazer estabilidade quando precisava. Nunca trouxe.
No mesmo horário levantava com a mochila nas costas e ia àquele cantinho vazio, só o dividia com o sol, que o acolhia pela metade, e o vento, que qualquer dia, jurava ela, jogaria suas coisas lá em baixo. Comia enquanto olhava as pessoas e se perguntava o que estava por trás delas. Sempre foi assim, gostava de ouvir, de saber, de conhecer, evitava quando precisava falar, explicar ou se apresentar, mas vez ou outra, entre as pessoas que observava, encontrava alguém com quem sabia que poderia dizer, e ensinar, e escancarar todos os sentimentos que não cutucava com frequência. Olhava as pessoas e se perguntava se alguma delas seria mais que uma história para ouvir.
Caminhava do lado esquerdo rotineiramente, mudava para o lado direito depois da quarta esquina e permanecia nele até chegar lá.
Não era o lugar em que queria estar, mas era por onde precisava passar para chegar até o desejado e não havia um tempo certo, o que a assustava. Não conhecia muitas pessoas dali, e quando ouvia sem querer conversas alheias por estar próxima demais entendia que era melhor assim. Algumas pessoas não sabem ser história, muito menos ouvintes. Apesar disso, no ano anterior conheceu histórias, e contou-as também. Nesse conheceu apenas uma, e entendeu que o clichê qualidade x quantidade têm lá seus fundamentos.
Entrou na sala e olhou em volta, em busca dos dois lugares em que se acomodaria até o anoitecer. De inicio não viu nem os lugares, nem qualquer outra coisa, mas em segundos, como se por aviso instintivo, viu mais do que procurava ali.
Ali.
Desde a primeira vez queria apagar o l e adicionar duas novas letras em seu lugar, queria chamar de aqui. Mas toda vez que tentava as mãos tremiam, o coração acelerava e os pensamentos pareciam estar fora de ordem. Não ia, continuava chamando-o de ali. Pensou em agir, até perceber que estava pensando, e ali não tinha mais nada além de uma porta.
Uma porta.
Sem nenhum olho mágico, sem nenhuma possibilidade de ver além, sem nenhum pequeno ato de vandalismo que dissesse algo. Era uma página faltando na história, um ser sem audição incapaz de ler lábios, quem dirá falar.
Queria falar;
Queria ouvir;
Queria saber;
Queria que fosse aqui;
MEU DEU GAROTA QUE TIRO EM FORMA DE TEXTO FOI ESSE, TO ME RECOMPONDO AINDA.
ResponderExcluirAmei ler cada linha, suspirei e fechei os olhos em alguns momentos, foi como ler um livro queria mais. Queria que não parasse, foi leve e bem gostosinho <3
escrevendodepijama.blogspot.com.br
Amei o texto, você escreve muito bem mesmo.
ResponderExcluirVocê escreve demaaaaais! Posta mais nesse estilo! <3
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