Ciranda de Pedra | Rata de Biblioteca.


Ligya Fagundes Telles é uma escritora brasileira, ainda viva, que ao lado de outros nomes consagrados representou a geração modernista da literatura nacional, sendo a única das nossas escritoras a já ter sido indicada para o prêmio Nobel de Literatura, além de atual integrante da Academia Brasileira de Letras. Todos esses fatos apresentados servem apenas para tentar quantificar a imensidão da autora de Ciranda de Pedra, primeiro livro seu com que tive contato.

Ciranda de Pedra, lançado pela primeira vez em 1954, é um romance de formação: acompanhamos o crescimento da personagem principal, Virgínia. No primeiro capítulo, sabemos que ela é apenas uma garota de dez anos, vivenciando os problemas de uma família que se desfez quando a mãe, Laura, decidiu viver um grande amor com o médico Daniel, levando Virgínia consigo e deixando suas duas filhas mais velhas com o ex-marido. Apesar da pouca idade, a personagem não é descrita como representante da inocência infantil, desde o primeiro momento, o leitor é apresentado aos seus pensamentos e dúvidas sobre o que a rodeia -- a mãe, antes considerada uma mulher tão bonita, atualmente passa os dias em um quarto, e é tratadas pelos outros personagens como insana; Daniel, o homem responsável pelo fim da família, é o único além de Virgínia que se preocupa com Laura, além de tratar bem à criança, o que a deixa confusa com relação aos seus sentimentos, que sempre se dividem entre odiá-lo por tudo o que causou ou aceitá-lo como parte da família; a empregada, que como Virgínia bem sabe, é apaixonada por Daniel; o pai, que parece sempre amar suas irmãs, mas nunca à ela; as irmãs, que a tratam com indiferença, e a Conrado, um dos amigos mais próximos de suas irmãs mais velhas, a quem Virgínia secretamente ama.

Após a morte de sua mãe, Virgínia decide viver em uma escola católica, e se na infância sempre sentiu-se à parte do quão boas eram suas irmãs, na adolescência busca o destaque, aprende diferentes línguas, e retorna para a casa do pai com a intenção de impressionar todos aqueles que foram protagonistas da sua infância solitária. Desse momento em diante, o enredo passa a ser sobre a desconstrução, para Virgínia e para o leitor, dos personagens que durante sua infância foram vistos de maneira soberana.

O nome dado ao livro é um detalhe que não deve passar despercebido: o desejo de Virgínia sempre foi pertencer. Ser amada por suas irmãs, por seu pai, ter a mãe de volta, ter sua família completa outra vez, estar entre os amigos das irmãs sem ser excluída das atividades, sentimentos que são representados por pequenos anões de jardim presentes na casa de seu pai, dispostos em uma roda, como se estivessem em uma ciranda. Virgínia quer fazer parte da roda, mesmo que ela seja de pedra.

A escrita de Lygia é marcada por intensidade e metáforas, com provocações aos costumes da sociedade -- que seguem nos pertencendo, tantos anos após a década de cinquenta --, e grande profundidade psicológica. Como escrito na pequena biografia da autora presente no fim da edição da Companhia das Letras, “Ligya Fagundes Telles já declarou em uma entrevista: “A criação literária? O escritor pode ser louco, mas não enlouquece o leitor, ao contrário, pode até desviá-lo da loucura. O escritor pode ser corrompido, mas não corrompe. Pode ser solitário e triste e ainda assim vai alimentar o sonho daquele que está na solidão.”


:・゚✧*:・゚✧ POR QUE LER UM NACIONAL? *:・゚✧*:・゚✧

A literatura nacional é, infelizmente, vista de maneira elitizada. O pouco contato que se tem com ela costuma ser ainda na escola, com livros de autores como Machado de Assis e outros cobrados pelos vestibulares tradicionais, o que não a torna atrativa para os mais novos. No entanto, a leitura da obra de Ligya Fagundes Telles é certeira para passar a gostar dos nacionais -- além do bônus de ser feita por uma escritora.


:・゚✧*:・゚✧ POR QUE NÃO LER UM NACIONAL? *:・゚✧*:・゚✧

Não vejo pontos negativos na leitura dos nacionais. É enriquecedor se identificar com as gírias, referências, e locais utilizados na narrativa.

Para quem é das curiosidades: Ligya é formada em Direito e em Educação Física pela USP.
Para quem é das amizades: Carlos Drummond de Andrade era amigo íntimo da escritora, com quem trocava muitas cartas, sendo algumas delas, comentários sobre rascunhos dos seus escritos.
Para quem é da TV: Ciranda de Pedra já foi adaptado para novela, na emissora Globo, em 1981 e 2008.

Em um quote:

“O mal maior foi não estar nunca presente, não ver de perto as coisas que assim de longe viraram histórias de semideuses e não de seres humanos inseguros, medrosos. Teria visto tudo com simplicidade, sem sofrimento."

Só acontece comigo #77

Vocês gostam de crianças? Eu costumo gostar, desde que elas não dividam o mesmo local que eu por muito tempo. Essa criança, por exemplo, veio na minha casa com a mãe buscar um frango congelado (a mãe de vocês também presenteia as amigas com frango congelado?), sentou na escada e ficou esperando o desenrolar do caso. 

Papo vai, papo vem, a criança possuindo suas prioridades e vendo que as duas mães presentes no recinto não paravam de falar, decidiu agir:

— Ô Catia (minha mãe, no caso), e o frango?


Projeto Rata de Biblioteca: a influência das bibliotecas na formação de novos leitores.


Certo dia, ao comentar no Instagram do Projeto Rata de Biblioteca (@rbiblioteca) a importância de conhecer e ocupar os espaços das bibliotecas públicas, a Natália, do blog Lapsos, sugeriu a criação de um post colaborativo que mostrasse o quanto esses locais podem incentivar o hábito da leitura para aqueles que não possuem condições de comprar livros com frequência, além de proporem atividades culturais e infraestrutura adequada para quem precisa estudar. Comentei sobre a ideia no meu Twitter e de cara recebi mais duas pessoas dispostas a conversar comigo sobre as bibliotecas que frequentam/frequentaram e como elas foram essenciais para transformá-las em leitoras, e foi assim que o IBGT (Instituto Brasileiro de Geografia da Tatiane) voltou a ser acionado. Espero que gostem da conversa, e que ela sirva de incentivo para não abandonarmos os livros que estão disponíveis para todos, em uma época em que o conhecimento e a informação verídica se fazem tão necessários.

Carolina, 20 anos -- Blog Krahe Lake.


Como foi/é sua a experiência com as bibliotecas? De que forma ela te mudou como leitora? Se lembra de como a conheceu?

Moro em frente à biblioteca que ''me criou'', literalmente só preciso atravessar a rua pra chegar nela, e a conheci graças a minha mãe, que me levou lá quando eu ainda era pequeníssima e fez um cadastro pra mim. Desde então, ela é um ponto de referência na minha vida e não há um mês sequer em que eu não a visite. Hoje sou cadastrada em outra biblio, mas descobri minha paixão pela leitura graças à primeira e os livros estão fácil no top 5 das melhores coisas do meu mundo, eles tem um papel significativo na formação da pessoa que sou hoje, então posso dizer que eu não seria ''eu'' se não fosse por ela. Nem consigo precisar muito bem como a biblioteca/os livros me ''mudaram'' porque já nem lembro mais de como era a Carolina antes deles. :)

Lembra de até 3 livros importantes pra você que foram emprestados delas? Por que foram importantes?

Como comprei pouquíssimos livros ao longo da vida (só em 2018 eu passei a ser uma pessoa assalariada, amém), quase tudo o que li é proveniente dessa biblio de que falei, e três livros muito importantes pra mim encontrados nela são:

1- O Jogo do Anjo, que me apresentou ao meu autor favorito da vida, Carlos Ruiz Zafón, que pra mim é a referência suprema da literatura de boa qualidade, criador de livros que eu sempre digo que levaria pro espaço se só tivesse uma chance de mostrar aos aliens o que é literatura. “A justiça é uma questão de perspectiva, não um valor universal.”

2- O Nome do Vento, do Patrick Rothfuss, o primeiro livro da minha trilogia/saga favorita da vida (infelizmente ainda inacabada), A Crônica do Matador do Rei, um calhamaço que eu virei noites lendo e que traz o melhor do que a literatura e a fantasia podem oferecer em termos de entretenimento puro e simples. ''Somos mais do que as partes que nos formam.''

3- Toda Poesia, do Paulo Leminski, o livro de 2018 que fez com que eu me apaixonasse de vez por poesia, depois de uma vida torcendo um pouquinho o nariz e achando que nunca seria pra mim (sou definitivamente uma pessoa mais de prosa). É poesia marginal e foi o pontapé que eu precisava pra começar a ler outros poetas me derretendo de amor.

''ameixas
ame-as
ou deixe-as''

Mia, 25 anos -- Blog Wink.


Como foi/é a sua experiência com as bibliotecas? De que forma ela te mudou como leitora? Se lembra de como a conheceu?

Como sou de família pobre nunca pudemos comprar livros durante a minha infância. Porém, meus pais sempre incentivaram o hábito da leitura. No início, era com os livros antigos que tinha lá em casa, da época em que eles eram jovens. Depois, quando entrei na escola, já cheguei perguntando onde estava a biblioteca - da qual eu tanto ouvia falar em casa, aparentemente um lugar mágico onde se podia pegar qualquer livro emprestado e conhecer novas histórias. A primeira coisa que fiz ao chegar na escola, na 1ª série, foi ir até a biblioteca e pegar um livro. Como já era alfabetizada, peguei A fada que tinha ideias, da Fernanda Lopes de Almeida. A história da Clara Luz mudou completamente a minha vida porque, além de ser mágica, me introduziu ao hábito de frequentar bibliotecas.

O tempo passou e troquei de escola para frequentar o Ensino Médio. Na nova escola eles não sabiam da proibição à biblioteca, então retomei meu ritmo de leitura e explorei clássicos da literatura dos quais eu nunca havia ouvido falar. Foi maravilhoso.

Quando me formei no Ensino Médio, ingressei em um curso de biblioteconomia porque meu amor por aquele espaço repleto de livros era tão grande que eu queria trabalhar com isso. Apesar de ter cursado, minha veia literária se mostrou mais forte do que minha aptidão para organização de estantes e vim para o jornalismo, curso no qual estou me formando. Porém, nada disso teria acontecido se não fosse a mágica da biblioteca na minha vida. Apesar de ter passado por um período em que fui obrigada a socializar mais com os meus colegas ao invés de ficar lendo, aquele sentimento incrível que só a literatura nos desperta permaneceu e vive até hoje.

Mesmo podendo comprar livros agora, ainda frequento a biblioteca da faculdade e faço propaganda das preciosidades escondidas naquelas estantes para todos os meus colegas. Eu não seria quem eu sou se não houvesse bibliotecas públicas (escolares) que me acolheram quando eu queria conhecer o mundo sem poder sair de casa.

Lembra de até 3 livros importantes pra você que foram emprestados delas? Por que foram importantes?

É difícil escolher apenas três dentre tantos, mas certamente A casa dos espíritos, da Isabel Allende, Contato, do Carl Sagan e A face da guerra, da Martha Gellhorn foram muito importantes para mim porque me fizeram romper barreiras culturais e desenvolver empatia por outras pessoas.

A casa dos espíritos é a saga de uma família chilena desde o século XIX até a terrível ditadura nos anos 1970. Eu nunca teria ouvido falar sobre a ditadura chilena se não fosse por esse livro, o que já o tornaria importante. Mas ele também se destaca por ter me apresentado ao realismo mágico latino-americano, que é uma das coisas mais lindas que existem.

Contato foi o livro que fez com que eu me apaixonasse por ficção científica e percebesse que não é só porque um livro fala de ciência em termos técnicos que eu não possa entendê-lo ou amá-lo. Claro que Sagan é Sagan e tinha toda uma linguagem de divulgação científica única, o que nem sempre se encontra no gênero. Porém, esse foi o livro que fez com que eu buscasse outros e adentrasse no universo do sci-fi.

A face da guerra é uma coletânea de crônicas escritas pela Martha Gellhorn, a correspondente de guerra mais longeva do século XX. Suas crônicas falam sobre pessoas normais, cidadãos comuns, vivendo nos horrores das guerras. São tocantes e reflexivas, o tipo de jornalismo que me inspira e que certamente mudou a minha forma de pensar em texto jornalístico.

Natália, 24 anos -- Blog Lapsos.


Como foi/é a sua experiência com as bibliotecas? De que forma ela te mudou como leitora? Se lembra de como a conheceu?

Aos 7 anos, quando entrei no ensino fundamental, fui estudar em uma escola muito grande e que ficava um pouco longe de casa. Minha mãe me incentivou a procurar a biblioteca de lá e pegar um livro emprestado - lembro que fiquei maravilhada, porque achava que só os funcionários podiam pegar os livros. Também lembro de ter medo de me perder enquanto procurava a biblioteca e não encontrar o caminho de volta para a sala e de ter ficado maravilhada quando a encontrei, porque ela era muito maior e mais organizada do que a biblioteca que eu conhecia. Tive a sorte de estudar em uma escola que recebia verba do município e do governo do estado. A biblioteca tinha uma quantidade excelente de livros - tanto de pesquisa quanto literários - e recebíamos livros novos todos os anos (as vezes alguns famosos).

Saí dessa escola para fazer o ensino médio em um Centro Federal. Outra vez fiquei deslumbrada com a biblioteca, que era ainda maior do que a outra. Eu, que antes eu só ia até a biblioteca para pegar livros emprestados, descobri que a biblioteca era um excelente espaço de estudo. Ela dispunha de algumas salinhas e sempre que podíamos, eu e meus colegas íamos até lá para adiantar os trabalhos e estudar para as provas. Essa biblioteca também assinava revistas e jornais, o que eu achava super chique. Consegui colocar em dia a leitura de diversos exemplares da Mundo Estranho - minha revista preferida.

Não tenho orgulho disso, mas aprendi a burlar o sistema da biblioteca durante a faculdade. Precisávamos de livros didáticos que eram usados por todos os cursos e que sumiam das prateleiras assim que o professor marcava a primeira prova do semestre. Por isso, pegava o livro no início e dividia o uso com uma colega. Devolvia no final do semestre, com um tempo de bloqueio que durava o restante do ano. Enquanto eu estava bloqueada, essa colega pegava os livros e dividia comigo.

Enfim, as bibliotecas fazem parte da minha vida desde sempre. Seja para estuda, para ler, para me divertir, para aprender - e até para tirar um cochilo no meio do caos do final do semestre.

Minha mãe trabalhava em uma escola e sempre pegava livros emprestados na biblioteca de lá para eu ler. Lembro que ela me levava para o trabalho de vez em quando e eu ficava sentada na biblioteca, olhando os livros.

Lembra de até 3 livros importantes pra você que foram emprestados delas? Por que foram importantes?

  1. A árvore que dava dinheiro - Domingos Pellegrini;
  2. O jogo do Camaleão - Marçal Aquino;
  3. Orgulho e preconceito - Jane Austen.
E vocês, possuem algum vínculo com bibliotecas? Lembram de livros que foram importantes na sua formação literária? Me contem!
© Limonada
Maira Gall