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Algumas das coisas que Frederico viu em vida. |
Caro Frederico,
Foram muitos os momentos que passamos juntos. As alegrias compartilhadas, as tristezas, na saúde e na doença, até que a morte nos separasse. E assim como esperado, separou. Era uma noite como todas as anteriores, você estava cheio de energia, mas resolvi poupá-lo e te deixei descansar um pouco, sozinho no quarto. Assim que voltei te segurei com cuidado, e dei o primeiro toque para te despertar. Você respondeu, mas não como eu esperava. Em um claro pedido de ajuda, não respondia aos meus toques e desligou sem que eu pedisse.
Você sabe que eu tentei. Te liguei, tirei a bateria, dei toquinhos pra ver se era apenas um dia ruim, mas você já tinha ido. Ficou ali, agonizando por horas, ligando e desligando até que a bateria acabasse. Quando me disseram que havia uma esperança de ser apenas um problema no software, fiquei tranquila. Acreditava mesmo em você, entende? Sabia que você tinha capacidade para superar isso. Me enganei.
Naquela tarde em que recebi a ligação, dizendo que o problema realmente era sua placa e que talvez fosse melhor abrir mão de você, abrir mão de nós, foi impossível não reviver em minha memória cada momento que passamos juntos. Foram três anos, talvez o relacionamento mais duradouro e estável da minha vida.
Você estava lá quando terminei o Ensino Médio; quando iniciei meu primeiro ano de cursinho; quando saí do antigo emprego; quando minha vida mudou drasticamente até se tornar o mais semelhante possível com o que é atualmente. Estava lá para ver a tocha olímpica passar, bem na nossa frente; ouviu as desafinações do karaokê da Liberdade; ficou quieto, mas sem sair do meu lado, durante muitas provas que precisei fazer; você estava lá no carnaval, e sentiu todo o ritmo brasileiro junto comigo.
Quando com o bluetooth ligado, me perguntavam porque "Fred" e não meu próprio nome. Eu pensava como devia ser a vida daqueles celulares sem nome, cujos donos não os viam como eu te via. Se por um lado aquilo me parecia desumano, por outro, vejo que talvez seja melhor. Afinal, se aqueles celulares um dia partirem, com certeza não receberão uma carta póstuma.
Ninguém jamais será capaz de substitui-lo, disso você pode ter certeza. Prometo contar aos próximos como você era, e tornar-te um exemplo a ser seguido por eles. Obrigada pelos vídeos, pelos prints, pelas fotos e por cada vez que me ajudou a disfarçar para não ter que conversar com alguém. Você estará para sempre em minha memória RAM.
Com amor, da sua antiga dona.
Em memória de Frederico Celularis Eligê (Junho de 2014 -- Julho de 2017).